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Certificação Orgânica no Brasil triplica em quase uma década

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Certificação Orgânica

Certificação Orgânica no Brasil

2 de jun de 2020 Notícias

O interesse por alimentos saudáveis e sem agrotóxicos tem impulsionado o mercado brasileiro de orgânicos. De acordo com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), em menos de uma década, o número de produtores que possuem selo de certificação orgânica no Brasil triplicou.  

Em 2012, havia no país quase 6 mil produtores registrados e, em março de 2019, o número ultrapassou 17 mil, um crescimento de 200%. As unidades de produção orgânica também apresentaram um crescimento expressivo: em 2010, eram 5,4 mil unidades registradas. Em 2019, saltou para mais de 22 mil, representando uma variação de mais de 300%. (veja gráficos)

Em relação ao volume de produção, não existe nenhum dado oficial e, apesar do crescimento exponencial dos registros no cadastro, a quantidade de produtores com certificação orgânica no Brasil pode ser muito maior.

“Os dados são bem dispersos e estamos tentando centralizar essas estatísticas. O que podemos afirmar, com base no Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos, é o número de produtores. Os números mais recentes saíram na última semana de março pelo Mapa: 21 mil produtores no Brasil, sendo que 2.355 estão em São Paulo. Note que esses 21 mil representam uma entrada, que pode ser de uma associação e dentro dela ter muitos produtores. Então, esse número pode ser bem maior. O sistema ainda é falho e precisamos desenvolver outro mais preciso”, afirma o engenheiro agrônomo e auditor fiscal federal agropecuário Marcelo Silvestre Laurino.

O Paraná é o Estado que mais possui produtores orgânicos certificados. Segundo o Mapa, no início de 2019, eram cerca de 3.500 produtores paranaenses, 20% do total de produtores rurais com certificação orgânica.

“Rio Grande do Sul é o segundo maior produtor, seguido de São Paulo. Aqui no Estado, o principal polo produtor é Campinas, onde tem o maior número de consumidores. A capital e o Vale do Paraíba também se destacam em produção e consumo”, explica Laurino.

Com um faturamento de R$ 4,6 bilhões em 2019, de acordo com balanço do Conselho Brasileiro da Produção Orgânica e Sustentável (Organis), a perspectiva de elevação do mercado é bastante promissora para os próximos dois anos.

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Marcelo Silvestre Laurino,
engenheiro agrônomo e auditor
fiscal federal agropecuário

A mesma previsão é compartilhada por Edwin Montenegro, assessor técnico da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA-SP). “O grande interesse pelo produto orgânico vem acontecendo nos últimos 12 meses, quando o consumidor assinalou que quer selecionar melhor o alimento. Ele quer saber a origem do que está comprando e o alimento orgânico permite essa rastreabilidade. Tem também a questão nutricional e o tipo de insumo que o produtor usa. Acredito que o orgânico está em um momento de ascensão.”

E não dá para falar de orgânicos sem falar de selo verde. Para a comercialização desses produtos, no Brasil, é obrigatória a regularização obtida por meio do selo de certificação orgânica emitido por uma empresa certificadora credenciada pelo Mapa e acreditada pela Coordenação Geral de Acreditação (Cgcre) do Inmetro.

Legislação orgânica

Existe toda uma legislação brasileira para produtos orgânicos que vem sendo construída há mais de 20 anos. Entre 1994 e 1997, houve um intenso e participativo processo de construção da lei e sua regulamentação, que culminou com a Lei nº 10.831 de 2003, e seu respectivo Decreto (nº 6.323) em 2007, e seus regulamentos no processo de certificação orgânica denominado Sistema Brasileiro de Avaliação da Conformidade Orgânica. Vale ressaltar que a certificação se tornou obrigatória somente em 2011.

Dentre os fatores regulamentados por essa legislação, estão a produção e a comercialização de alimentos e outros produtos de origem orgânica. No que se refere à comercialização, é o processo de certificação que garante aos consumidores que determinado produto está livre de agrotóxicos, transgênicos e outros produtos químicos sintéticos. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento é o órgão que coordena e fiscaliza as ações nesse tema.

“A produção de orgânicos já existe há muitos anos no Brasil, mas os produtos orgânicos passaram a ser regulamentados somente em 2003, com a criação da lei federal e, a partir dessa regulamentação, é que nasceram as certificadoras oficiais, que emitem o certificado de selo orgânico, o qual reconhece o produto como originalmente orgânico”, explica Montenegro.

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Edwin Montenegro, assessor técnico
da Secretaria de Agricultura e
Abastecimento do Estado de São Paulo

Selo certificação orgânica

A comercialização de produtos orgânicos em supermercados, restaurantes, hotéis, lojas, indústrias e outros locais depende de certificação junto aos Organismos da Avaliação da Conformidade Orgânica (OAC) credenciados no Mapa, que emitem o Selo de produto orgânico (SisOrg), garantindo ao consumidor que determinado produto é, de fato, orgânico.

Até o momento são 40 OAC credenciados, sendo 27 Sistemas Participativos de Garantia da Qualidade Orgânica (SPG) e 13 certificadoras por auditoria. O tipo de certificação é descrito no selo: por sistema participativo ou por auditoria.

Para que o produtor possa utilizar o selo, ele deve fazer parte do Cadastro Nacional de Produtores Orgânicos, o que é possível somente se estiver certificado por um dos três mecanismos de certificação.  Laurino explica cada um deles:

Certificação por auditoria

“A concessão do selo é feita por uma certificadora pública ou privada credenciada no Ministério da Agricultura. O produtor tem total autonomia em escolher a certificadora, que precisa estar regularizada no Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) e no Mapa para realizar esse trabalho. O preço para conseguir um certificado varia de acordo com a instituição.”

Sistema participativo de garantia (SPGs)

“A principal característica é a responsabilidade coletiva dos membros do sistema, que podem ser produtores, consumidores, técnicos e demais interessados, representados por uma pessoa jurídica, um Organismo Participativo de Avaliação da Conformidade (Opac), que responde pela autocertificação. Nesse mecanismo há um envolvimento dos produtores e um ajuda e fiscaliza o outro. Além disso, esse sistema diminuiu bastante o custo da certificação.”

Controle social na venda direta

“Nesse mecanismo, os agricultores familiares podem praticar a venda direta, seja em feiras livres, seja na entrega em domicílio, mas precisam se reunir em uma organização de controle social, que tem um funcionamento similar ao sistema participativo. Os agricultores passam a fazer parte do Cadastro Nacional, mas não recebem o selo. No entanto, o consumidor tem o direito de pedir para conhecer a propriedade ou pedir a declaração de cadastro que identifica a origem do produto.”

O Brasil é pioneiro na certificação participativa de orgânicos.  O método surgiu para facilitar a adesão de agricultores que não entrariam no processo usual de certificação por conta da metodologia, burocracia e preço.

É importante destacar que os Sistemas Participativos de Garantia têm o mesmo valor da certificação por auditoria. No entanto, existem limitações quanto à exportação dos produtos certificados por SPGs porque a grande maioria dos países trabalha exclusivamente com auditoria.

Geralmente, a certificação é válida por um ano. E a cada renovação o produtor tem a possibilidade de melhorar o selo, inclusive obter um que permita a exportação. 

Além das visitas programadas, há também as aleatórias, por isso, é importante que o produtor mantenha os dados relacionados à produção sempre atualizados e disponíveis no ato da vistoria. 

“O produtor que descumprir de alguma maneira a legislação pode sofrer sanções como autuação, advertência, apreensão de mercadoria e suspensão do credenciamento”, observa Laurino.

Entraves para obter a certificação

Embora a demanda por produtos orgânicos tenha aumentado consideravelmente, a oferta acompanha a procura. São poucos os produtores certificados e isso acontece porque a transição de uma agricultura convencional por um modelo de produção orgânica esbarra em uma série de obstáculos, como dificuldades técnicas e de logística, excesso de burocracia e carência de insumos.

“O mais complicado da certificação orgânica nem é o custo. É o volume de informações que o produtor precisa fornecer para a certificadora. O plano de manejo orgânico, por exemplo, é um documento obrigatório. Estamos tentando conseguir uma uniformização e colocar no plano de manejo só as informações essenciais. De uma certa forma, isso é uma dificuldade muito grande e essa dificuldade aumenta quanto menor o grau de formação dos produtores.”

“Além do plano de manejo, é necessário ter o caderno de compras em ordem. A documentação é fundamental no processo de certificação e é um problema a falta de hábito dos produtores brasileiros em documentar o que fazem. Essa é a principal complicação para o processo da certificação. Outro obstáculo é a logística que, assim como em outros segmentos, tem uma série de problemas, como o custo alto, o que está levando muitos produtores a desistirem da produção”, comenta Laurino.

Montenegro concorda com o colega e ressalta a importância da extensão rural no auxílio ao produtor na hora de solicitar a certificação. “Antes de o produtor contatar uma certificadora, é necessário que ele converse com um engenheiro agrônomo ou técnico, que vai orientá-lo em todos os procedimentos para transformar a sua produção em orgânica. Quando o extensionista determinar que o produtor está apto, aí sim ele pode chamar a certificadora e passar por todo o processo de auditoria para receber o selo orgânico. Claro que o produtor pode chamar a certificadora direto, mas o risco de pagar e não passar na auditoria é grande. Não é papel da certificadora instruir ou capacitar, ela apenas faz a auditoria para declarar se o produtor está cumprindo a lei.”

O relato de um produtor certificado

O engenheiro naval Antonio Feres Neto, do Sítio Escola Portão Grande, em Várzea Paulista, a 60 quilômetros de São Paulo, resolveu investir na produção orgânica em 2012. Em sua propriedade são produzidas frutas e legumes, como abobrinha, berinjela, couve-flor, banana prata e caqui, entre outros.

“A propriedade era do meu pai, já falecido, que tinha um armazém e vendia secos e molhados na cidade. Mas ele sempre se achou um  agricultor. Então, no primeiro dinheiro que juntou, comprou o sítio e passava lá os fins de semana plantando junto com os caseiros. 

Quando ele morreu, decidimos transformar o sítio numa ONG que fizesse  algum trabalho social na região. “Assim, surgiu o Sítio Escola Portão Grande, que tem como objetivo cultivar e oferecer à sociedade produtos orgânicos de qualidade”, explica Neto. A ONG também oferece cursos e Dia de Campo sobre o tema.

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Antonio Feres Neto,
proprietário do Sítio Escola
Portão Grande

Organizado, ele conta que não encontrou dificuldades na hora da certificação. “Somos certificados por auditoria e temos um sistema de gestão onde lançamos tudo o que fazemos, compras, vendas, manejos (caderneta de campo), etc. Isto facilita bastante o trabalho da certificação.

Ele diz que o custo da certificação é significativo, mas dilui-se ao longo do período anual. “O que pesa de fato é o custo da mão de obra, que é utilizada intensamente no cultivo orgânico”, enfatiza.

Na propriedade de Neto, são produzidos mensalmente cerca de duas toneladas de FLV (frutas, legumes e verduras), que são distribuídas em três bancas próprias em feiras orgânicas na capital e também no fornecimento a revendedores na região e em São Paulo.

“A procura é maior que nossa capacidade de produção atual, mas procuramos sempre preservar o princípio da comercialização direta e no mercado local, dentro do possível”, finaliza.

Por: Sandra Mastrogiacomo